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Resistência ao BIM e a Síndrome do Cobertor Quente

Por que alguns profissionais não querem abraçar o futuro?

Indubitavelmente, o BIM é considerado queridinho pela indústria da construção civil há muito tempo. Esse protagonismo gerou um certo ranço em alguns profissionais, que consideram o nível de adesão inversamente proporcional à importância que o mercado vem atribuindo à boa concepção projetual. Essa percepção foi alimentada por meio das inúmeras promessas de vantagens milagrosas vinculadas à tecnologia, que deixou de ser apresentada como estratégia de gestão e desenvolvimento de projetos, para transformar-se no produto dominante.

Neste caso, o posicionamento de alguns “criadores de conteúdo” acabou influenciando negativamente a percepção de algo extremamente positivo. Admito que não posso tirar a razão da desconfiança de alguém que se sentiu enganado por propagandas falsas. Porém, grande maioria das pessoas contrárias ao BIM possuem algo que chamo de síndrome do cobertor quente.

Sabe aquele cobertor macio que tanto amamos? Pois é, alguns se apegam tanto à sua zona de conforto que não querem sair debaixo da manta, apesar de existir um mundo cheio de oportunidades lá fora! Esses profissionais são semelhantes àquelas crianças que fingem não ver os vegetais no prato, ignorando todas as vantagens e melhorias que poderiam ocorrer, a fim de continuar reclamando da situação atual.

Nessa semana, fui questionado por um amigo sobre quais atitudes tomaria se, durante um processo de implantação do BIM, encontrasse aversão por parte dos profissionais envolvidos. Devo confessar que passei por esse tipo de resistência várias vezes: em algumas, consegui contornar com muita leveza e certa facilidade… em outras, me deu muito trabalho.

Nessas situações, o primeiro ponto que procuro levantar é o grau de apoio que estou recebendo da diretoria em relação à implementação. Sem ajuda “de cima” fica impossível: toda alteração de rumo, relativa à gestão, deve ser edificada pelo corpo estratégico da empresa. Não é novidade a quase ninguém que a diretoria possui autoridade e influência significativa em qualquer organização.

Se você contar com essa chancela, terá respaldo ao tomar decisões e efetivar iniciativas relativas à adoção. Esse suporte poderá auxiliar na obtenção de recursos financeiros, em adaptações de prazos destinados aos treinamentos e capacitações, bem como na superação de possíveis obstáculos.

Enfim, o que levar em consideração?

Com esses trunfos nas mãos, começo a trabalhar os pontos de desconforto. Agendo reuniões individuais com TODOS os envolvidos que fazem parte do fluxo (inclusive os que estão felizes com as mudanças). Quando me deparo com um stakeholder descontente, tento compreender seus principais receios, sem deixar de informar que tenho aprovação irrestrita da diretoria. Normalmente, as inquietações estão relacionadas a aspectos recorrentes:

  • Medo do desconhecido: nós tendemos a sentir-nos tranquilos com o que é familiar e conhecido. A modificação de paradigmas envolve a entrada em território desconhecido, o que gera medo e ansiedade.
  • Zona de conforto: temos uma tendência natural a ficar em nossa zona de conforto, onde nos sentimos seguros e familiarizados. A transição muitas vezes exige sair desse estado e enfrentar novos desafios e aprendizados. Isso é desconfortável e desencadeia atitudes contrárias.
  • Perda de controle: a necessidade de se adaptar a uma nova situação faz com que os stakeholders aumentem sua relutância, porque se sentem tranquilos quando têm controle sobre sua vida profissional. A perda desse domínio suscita objeção.
  • Esforços envolvidos: mesmo que as adequações sejam para melhor em longo prazo, exigirão esforço, tempo e recursos no curto prazo. Com isso, os colaboradores tendem a resistir por preferirem ajustes menos profundos e complexos.
  • Identidade e pertencimento: cada um de nós geralmente tem a identidade formada em torno das relações existentes no ambiente de trabalho. Ajustes nas engrenagens das empresas afetam essa conformidade e o senso de pertencimento, gerando instabilidade emocional.
  • Experiências passadas negativas: tentativas anteriores malsucedidas ou negativas levam as pessoas a desenvolver aversão, o que tende a  transformá-las em opositoras a qualquer tipo de alteração.

Eita, mas como descascar esse pepino?

Cada um desses temores demandará de atitudes distintas para resolução. Porém, de maneira geral, você pode seguir os passos que apresento abaixo:

  1. Compreenda as preocupações: ouça atentamente às perturbações das partes envolvidas. Tente entender suas perspectivas e motivos por trás da aversão. Isso ajudará a criar empatia e a estabelecer uma base adequada a encontrar soluções que atendam às necessidades de todos.
  2. Desmistifique preconceitos: muitas vezes, o horror ao BIM é resultado da falta de informação ou compreensão inadequada sobre o que a tecnologia realmente envolve. Compartilhe conhecimentos e recursos relevantes que possam esclarecer os benefícios e as oportunidades, mostrando exemplos de projetos bem-sucedidos e casos de uso que possam ilustrar as vantagens.
  3. Demonstre os benefícios tangíveis: mostre melhorias concretas relativas ao trabalho e aos resultados. Apresente exemplos de como os novos processos auxiliam a economizar tempo, reduzir erros, melhorar a comunicação e a colaboração entre as equipes, aumentar a eficiência e a qualidade dos projetos.
  4. Forneça treinamento e suporte adequados: a abominação muitas vezes está relacionada à falta de conhecimento ou à insegurança em relação ao uso das ferramentas e práticas de gestão envolvidas. Certifique-se de oferecer treinamentos adequados à capacitação de forma eficaz. Além disso, esteja disponível nas resoluções das dúvidas, fornecendo suporte técnico e incentivo ao aprendizado contínuo.
  5. Promova a colaboração e o compartilhamento de experiências: incentive a troca de conhecimentos e experiências entre os envolvidos. Isso pode ser feito através de workshops, grupos de discussão ou brainstormings. Permita que os atores compartilhem seus desafios, aprendizados e soluções encontradas, criando um ambiente de apoio mútuo.
  6. Seja paciente e persistente: a implantação do BIM é um processo gradual e leva algum tempo até que a indisposição diminua. Mostre que você está comprometido com o objetivo final e esteja aberto a ajustes e adaptações ao longo do caminho.

E se não der certo?

Apesar destes esforços, alguns permanecerem contrários às novas premissas? Pode ser necessário considerar suas substituições. De qualquer forma, antes de tomar essa decisão drástica, algumas táticas poderão ser empregadas. Vale a pena, por exemplo, reunir um grupo que esteja confortável com a nova tecnologia para tentar convencer os incrédulos. Quem sabe um engenheiro experiente ou um arquiteto persuasivo possam mudar essas mentes relutantes? Outro ponto a ser considerado é a diplomacia: considere organizar um “Conselho do BIM”, onde os mais receosos possam expressar suas preocupações e discutir possíveis soluções.

Cuidado: a falta de entusiasmo pode minar sua energia e destruir seus objetivos.

Não deu certo? Faça trocas! Procure pessoas que estejam dispostas a ajudar a impulsionar a implantação. Afinal, é melhor ter um time de entusiastas do que arrastar os pés com os teimosos. Lembre-se: substituir colaboradores é uma medida extrema e deve ser considerada como último recurso. Certifique-se de que todas as opções foram exploradas antes de tomar essa decisão. Quem sabe, com um pouco de paciência, até os resistentes se rendam aos encantos do BIM!

Sobre o autor

Marcelo Holsback

Empresário há mais de 20 anos, atuando em vários setores econômicos, também possui negócios no segmento de AECO nos seguintes nichos: implantação e modelagem BIM, com experiência internacional; escritório de projetos multidisciplinares, realidade aumentada e virtual; manutenção Predial, montagem e instalação de elevadores; construtora com foco em imóveis residenciais de alto padrão. Além disso, atua como gerente BIM da empresa Engeti, uma das maiores empresas de projetos de infraestrutura do Brasil.

Sempre atento ao segmento, foi idealizador do Grupo Aprenda BIM, inaugurado em 2015. Graças as incessantes atividades relacionadas à disseminação do BIM no Brasil, foi nomeado Diretor de Marketing da CBIM Nacional e Presidente Interino da CBIM/SP. Com extensa expertise no aprimoramento de sistemas, tornou-se Beta Tester de inúmeras soluções BIM, entre elas Orça BIM, Augin, VOBI e Unreal Datasmith. Apaixonado pela docência, é professor de inúmeros cursos de pós-graduação.

Ingénieur en Génie Informatique et en Génie Mathématique pela EISTI FRA e Systems Engineer pela Microsoft University. Graduado em Arquitetura e Urbanismo (Universidade Tricordiana) e em Gestão Pública (Univesp). MBA em Gestão de Projetos. Pós-graduado em Gestão de Investimentos e Análise de Mercado.

Apaixonado por sua família, possui quatro filhos! Santista roxo e filho do maior BIM Manager de todos os tempos.

4 thoughts on “Resistência ao BIM e a Síndrome do Cobertor Quente”

  1. Muito bom o artigo. Concordo que um dos maiores entraves do BIM tem relação com as pessoas. Desafio enorme, mas temos que encarar.

  2. Parabéns pela explicação e eloquência no seu artigo, concordo plenamente porque já passei por situações semelhantes, sou da opinião que em tudo na vida, precisamos de ter uma mente aberta se quisermos ser bem sucedidos, nem sempre acontece, mas temos que insistir.
    Penso que um dos pontos mais importantes do artigo remete a um treinamento e suporte adequados, infelizmente existem muitos “pseudo-criadores de conteúdos” que se preocupam mais em faturar do que transmitir informações simples, adequadas, eficazes e em conformidade com o seu modus operandis.
    Obrigado pela partilha.
    Um abraço.

  3. Excelente! Um passo-a-passo valioso para um desafio natural do momento em que vivemos: o de mudança de cultura, que exige diálogo aberto com todas as partes envolvidas, inclusive tomadores de decisão e lideranças.

  4. Perfeitas e esclarecedora suas colocações, como sempre.
    Na minha opinião e indo mais a fundo, o BIM, veio para nos esclarecer quem sabe projetar, aprender e compartilhar seus conhecimentos!

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